A República em Sergipe II

14/07/2006, 19:32

Por Luiz Antônio Barreto

José de Siqueira Menezes, engenheiro militar, era republicano e integrante da Maçonaria em Laranjeiras
A campanha abolicionista e a propaganda republicana andaram lado a lado em Laranjeiras, como compromissos democráticos, ainda que a luta em favor da República tenha obtido maior visibilidade. O movimento estabeleceu, ainda, conexões importantes com a Maçonaria e com os missionários protestantes, que percorriam o Brasil na tentativa de fixar igrejas evangélicas, além, das íntimas ligações que tinham os seus integrantes, quase todos tocados pelas idéias cientificistas que dominavam o ambiente intelectual da segunda metade do século XIX.

A campanha abolicionista teve várias faces, a começar, ao mesmo tempo, que a propaganda republicana, pelas manifestações estéticas, que revelaram figuras geniais como o poeta Castro Alves, o maestro Carlos Gomes, representativos de uma geração que tomou as ruas, as redações dos jornais, os corredores das faculdades, em defesa da dignidade humana. Depois foram criadas as Sociedades, muitas delas secretas, destinadas a somar esforços em prol da libertação dos escravos.

Em Aracaju foi fundada e instalada à rua de Capela, a Sociedade Libertadora Sergipana, liderada por Francisco José Alves, agregando a colaboração de outras pessoas, como a professora Etelvina Amália de Siqueira. A Sociedade, conhecida como A Cabana do Pai Tomás, numa alusão ao romance de Herriet Becher Stowe, editava o jornal “O Libertador”, como órgão da causa abolicionista. Francisco José Alves, contudo, não era um partidário da propaganda republicana e chegou mesmo a lamentar o fim da monarquia.

A propaganda republicana ganhou importância em Laranjeiras, nos pequenos jornais, graças a uma somação de fatos favoráveis, a saber: a presença do médico Domingos Guedes Cabral clinicando, e sua substituição por Felisbelo Freire; a pregação dos missionários norte-americanos, presbiterianos, e a conseqüente criação da Igreja protestante, em 1884; a condição de maçons, de alguns dos

Livro escrito por Baltazar Góes
“rebeldes” listados por Baltazar Góes em sua “A República em Sergipe”. Ainda que em Estância, em Vila Nova (Neópolis), em Maruim a República tenha inspirado alguns engajamentos, foi em Laranjeiras, sem dúvida, que o movimento ganhou densidade e liderança, promovendo a organização política para a transição de 1889.

Guedes Cabral tem sido uma unanimidade da crítica, tanto pela posição contestadora na Faculdade de Medicina da Bahia, como pelo seu papel intelectual exercido em Laranjeiras, onde clinicava, em Maruim, onde era orador do Gabinete de Leitura. Foram sete anos de intensa atividade, agitando toda a zona da Cotingüiba com suas idéias livres, que soavam como novidades diante do magistério moral da Igreja católica, presente desde os primeiros tempos da colonização.

Todos os que historiam a propaganda republicana em Sergipe, especialmente em Laranjeiras, afirmam, convictos, a contribuição de Guedes Cabral sem a qual os fatos não teriam os desdobramentos que tiveram. O padre Filadelfo Jônatas de Oliveira, que foi por longo período o vigário de Laranjeiras, atribuía a posição de Guedes Cabral à tuberculose, doença que forçaria seu retorno para a Bahia, em 1882 e sua morte, em janeiro de 1883. Poucas vezes alguém influiu tanto uma geração, quanto o médico baiano em Laranjeiras.

Três pequenos jornais serviram, magistralmente, de veículos propagandísticos: “O Horizonte”, “O Laranjeirense”, “O Republicano”, cada um com seu corpo redatorial, seu papel e sua influência, na marcha batida para mudar os fatos da história. Cada um cumpriu, no seu tempo, fases essenciais do movimento republicano, de acordo com as condições objetivas existentes em Laranjeiras. Tais jornais, vistos no contexto da imprensa sergipana, se destacam pela coragem dos seus patrocinadores.

Havia uma crítica, nem sempre velada, com relação a certos integrantes do movimento republicano e que tinham contatos e amizades com os senhores escravocratas e monarquistas. No entanto, o valor e o alcance da propaganda retiraram qualquer ilegitimidade que pudesse sublinhar a pregação sincera da geração republicana. Estiveram nos jornais, também, maçons e protestantes, engrossando o caldo propagandístico, ampliando os horizontes do recrutamento social.

Alguns dos republicanos de Laranjeiras eram iniciados da Maçonaria e freqüentavam a Loja Cotinguiba, fundada em 10 de novembro de 1872. Firmino José Rodrigues Vieira, por exemplo, engenheiro e um dos expoentes da propaganda republicana em Laranjeiras entrou na Maçonaria em 1873, enquanto José de Siqueira Menezes, engenheiro militar, e Marcelino Jose Jorge, também militar, entraram na mesma Loja em 1881. Outros republicanos se tornaram maçons, declarando liberdade religiosa, o que facilitaria a presença dos missionários protestantes com suas bíblias e seu convencimento.

Na sua “História Constitucional da República”, Felisbelo Freire atribui a Siqueira Menezes todo o mérito de comandar a Proclamação da República em Sergipe, destituindo o então vice-presidente Tomás Cruz, que estava na presidência esperando a chegada do novo presidente nomeado para a Província, Manoel Joaquim de Lemos, e organizar o novo Governo. O engajamento protestante, que pode ser avaliado pelas polêmicas que estão nos jornais e que foram objeto de estudo de Jackson da Silva Lima no seu “Estudos Filosóficos”, também pode ser representado pela participação direta de Manoel Antonio dos Santos David, representante em Laranjeiras dos missionários norte-americanos, ajudando a manter aberta a Igreja e fazer funcionar a Escola Americana, esta exaustivamente estudada por Ester Fraga Vilas Boas Carvalho do Nascimento.

Manoel Curvelo de Mendonça, que era apenas um rapaz de 17 a 18 anos quando participou do movimento republicano em Laranjeiras, publicou um livro – “Sergipe Republicano”, com o qual amplia, criticamente, o ensaio de Baltazar Góes. Aluno de Baltazar no Liceu Laranjeirense, ouvinte das conferências do Clube Democrata e participante do movimento, desde a propaganda até a fundação do Clube Republicano, Manoel Curvelo de Mendonça recupera o ideal republicano, sem expor a desilusão confessada pelo seu mestre.

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